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  • Foto do escritorDr. Nuno Pinto Ferreira

O Masculino. Construção da identidade do homem maduro

Atualizado: 9 de fev. de 2021

A identidade masculina tem vindo a despertar o interesse de várias áreas do saber como a Sociologia, a Antropologia e a Psicologia. Deste interesse resultou num conjunto vasto e diversificado de estudos e análises sobre o tema, e uma literatura mais abrangente e específica sobre a Masculinidade, temática esta que aborda o Masculino em todas a suas nuances, porém, sem abdicar do seu oposto, o Feminino. Também é consensual entre os autores que a identidade masculina vem sofrendo alterações nas últimas décadas, e que esta atravessa uma crise sem precedentes com acentuadas repercussões, quer nos indivíduos, tanto homens como mulheres, bem como na sociedade como um todo. Uma das repercussões que temos conhecimento, diante dessas alterações identitárias, está descrito por Moore & Gillette (2005), na qual eles referem-se ao que chamam de “confusão de sexos”. Segundo os autores, um fenómeno cada vez mais presente nas sociedades ocidentais, nomeadamente, Estados Unidos da América e Europa. A conclusão que os autores nos apresentam é que “é cada vez mais difícil referirmo-nos a alguma coisa como tendo uma essência masculina ou feminina, única e exclusivamente” (2005: 15). Moore & Gillette apontam ainda para um outra faceta da repercussão deste fenómeno, e que está relacionado com o “desmoronamento da família tradicional”. Eles afirmam que é cada vez mais frequente a ausência da figura paterna no sistema familiar na atualidade. Este pai ausente, quer do ponto de vista afetivo, quer do ponto de vista físico, muitas vezes, em ambas as dimensões, resulta na “devastação psicológica dos filhos de ambos os sexos”. Referem ainda os autores que “o pai fraco ou ausente reduz a capacidade tanto das filhas como dos filhos para atingirem a identidade dos seus sexos e para se relacionarem de forma intima e positiva com membros tanto do próprio sexo como do sexo oposto”. Ainda mais quando atribui-se o ónus da responsabilidade da crise de identidade masculina apenas no desmoronamento do sistema familiar tradicional, isso seria estar a olhar apenas para uma parte do problema. Para entendermos a verdadeira dimensão dessa será necessário refletir sobre os “processos rituais“ ainda realizados nas sociedades tradicionais, assim como, o modelo organizacional e social da nossa sociedade, e que tem sido profundamente criticado pelas feministas, o patriarcado (Moore & Gillette, 2005). O que é isto de “processos rituais” que Moore & Gillette trazem para a nossa reflexão? As investigações dos antropólogos Arnold van Gennep e Victor Turner sobre o trabalho de campo de sociedades tradicionais dão a conhecer um conjunto de práticas e rituais, que são preparados e realizados cuidadosamente por essas sociedades, e que possuem o objetivo de auxiliar os rapazes dessas tribos a transitarem para a idade adulta. Os antropólogos referem que nas sociedades ocidentais, com o passar do tempo, os “rituais de iniciação” perderam-se, ou mesmo aqueles que ainda persistem, perderam a força e a credibilidade. Estes, parecem ter “sido desviados para canais mais estreitos e com menos energia - para fenómenos a que chamam de pseudo-iniciações” (Moore & Gillette, 2005: 16). A forma desacreditada de como a sociedade moderna vive e realiza estas pseudo-iniciações, parece ter muita influência dos movimentos culturais importantes como o Iluminismo e a Reforma Protestante que, ao desinvestir do caráter sagrado e transformador destes cerimoniais, restou apenas o que Victor Turner chamou de “mero cerimonial”. Quer isto dizer que os rituais que persistem ainda nas sociedades modernas “não têm o poder necessário para conseguir uma transformação genuína da consciência. Ao nos desligarmos do ritual, livrámo-nos dos processos através dos quais, tanto homens como mulheres, conseguiam chegar à identidade do seu sexo de forma profunda, madura e que contribua para melhorar a vida” (Victor Turner). Por outras palavras, quando uma sociedade desacredita os “processos rituais” pelos quais os indivíduos tinham a oportunidade de formar uma identidade própria e, no caso dos homens, quando a iniciação para a idade adulta não se realiza ou realiza-se através de “pseudo-iniciações”, a transição para a idade adulta não acontece e o sujeito permanece na Psicologia do Rapaz. E, o que é isto de Psicologia do Rapaz? Segundo os autores, as marcas que identificam a Psicologia do Rapaz são facilmente perceptíveis, e estão presentes um pouco por toda a sociedade moderna. “Entre elas, encontram-se a exteriorização de comportamentos abusivos e violentos em relação a outros, tanto homens como mulheres; passividade e fraqueza, a incapacidade de agir de forma eficaz e criativa na própria vida e de fomentar vida e. Criatividade nos outros (tanto homens como mulheres); e, frequentemente, uma oscilação entre os dois - maus tratos/fraqueza (…)” Moore e Gillette (2005:16) O outro factor apontado para a dissolução da identidade masculina é o patriarcado. O patriarcado, enquanto sistema organizacional e regulador das sociedades ocidentais, desde pelo menos o segundo milénio antes da era de Cristo até ao presente a sociedade atual, tem sofrido violentas críticas dos movimentos feministas, face ao poder opressivo e abusivo em relação ao Feminino, bem como, em relação as mulheres de modo geral. “Na critica radical que fazem ao patriarcado, algumas feministas concluem que a masculinidade no seu âmago é essencialmente abusiva e que a ligação a “eros” - ao amor, à afinidade e à meiguice - provém apenas do lado feminino da equação humana” (Moore & Gillette, 2005: 17). Contudo, Moore & Gillette postulam que “o patriarcado não é a expressão de uma masculinidade profunda e bem enraizada, uma vez que a masculinidade profunda e bem enraizada não é abusiva”. Pelo contrário, continuam: “o patriarcado é a expressão do masculino imaturo. É a expressão da psicologia do Rapaz e, em parte, o lado sombra - ou louco - da masculinidade. Dá expressão ao masculino atrofiado, fixado em níveis imaturos”. E reforçam: “O patriarcado é um ataque à masculinidade na sua plenitude, assim como à feminilidade na sua plenitude. Aqueles que estão embrenhados nas estruturas e dinâmica do patriarcado procuram dominar não só as mulheres mas também os homens. O patriarcado baseia-se no medo - no medo do rapaz, no medo do masculino imaturo - das mulheres, evidentemente, mas também no medo dos homens. Os rapazes temem as mulheres. Mas também temem os homens de verdade. O macho patriarcal não aceita bem o total desenvolvimento masculino dos seus filhos ou dos seus subordinados homens, assim como não aceita o total desenvolvimento das suas filhas ou das suas empregadas mulheres. É a história do superior hierárquico no escritório que não suporta que sejamos tão bons como realmente somos. Com que frequência somos invejados, odiados e atacados de forma direta e de forma passivo-agressiva, mesmo enquanto tentamos desvendar quem realmente somos em toda a nossa beleza, maturidade, criatividade e generatividade! Quanto mais harmoniosos, competentes e criativos nos tornamos, mais hostilidade dos nossos superiores, ou mesmo daqueles que têm o mesmo estatuto que nós, parecem atrair. Aquilo que realmente nos está a atacar é a imaturidade dos seres humanos que estão aterrados com os nossos avanços no caminho que nos leva à plenitude de ser masculina ou feminina” (Moore & Gillette, 2005: 18). Assim sendo, concluem que o sistema patriarcal expressa a dimensão da Psicologia do Rapaz. Ele não reflete o potencial masculino maduro na sua essência, na plenitude do seu ser. Afirmam, inclusive, que muitos homens que procuram ajuda psicoterapêutica estão esmagados pelo feminino, logo, o que sentem falta, verdadeiramente, é de uma ligação verdadeira e genuína às energias masculinas profundas e instintivas, para atingirem a potência de uma masculinidade madura. O que impede o homem de se ligar ao seu potencial masculino maduro é a ideia de patriarcado e a critica feminina sobre a pouca masculinidade, além da cobrança constante de que esta ainda poderá ser conquistada, o que acaba por impedi-los de atingir uma masculinidade madura. A Masculinidade é o resultado de um investimento num processo que visa uma transformação do masculino imaturo (Psicologia do Rapaz) e potencia o masculino maduro (Psicologia do Homem). Este processo é gradual, profundo e revelador da potencia Masculina do sujeito. Para que este ocorra de forma consciente e plena, a iniciação deverá ser realizada, orientada e assistida por um outro homem que já tenha percorrido este mesmo processo e conquistado a plenitude do Ser Masculino. Uma das fontes deste conhecimento está inscrita nas narrativas míticas, filosóficas e psicologicas. Assim sendo, surge a psicoterapia como ferramenta de analise e intervenção potencialmente eficaz na descoberta e construção da identidade masculina do sujeito com o objectivo de resignificar o conceito de "macho" para ascender ao masculino maduro. Psicologia do Homem, Masculinidade, Potência Masculina, Ansiedade


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